15 de Agosto: o Ferragosto na Itália

A Itália, como sabemos, é rica de tradições, sobretudo ligadas às festividades de verão. Uma das mais famosas é o Ferragosto (do latim Ferie Augusti – repouso de Augusto) – dia 15 de agosto –, em que se comemora a Assunção de Maria (Maria Assunta), marcando também o ponto de partida para as sempre sonhadas férias italianas. Essa festividade foi instituída pelo imperador Augusto no século 18 a.C, e se juntava às já existentes e antigas comemorações do mês de agosto, como, por exemplo a Vinalia Rustica ou a Consualia, em que se celebrava o deus Conso, uma das mais antigas divindades agrárias romanas. Nessa ocasião se festejava também a colheita da uva e o encerramento dos principais trabalhos agrícolas do ano.

Assim, a antiga comemoração de Ferragosto era uma data importante que concluía as principais atividades do mês, proporcionando, desse modo, um merecido período de repouso, também denominado Augustali, necessário após todo o trabalho intenso desenvolvido durante as semanas anteriores. No decurso das festividades, em todo o Império, eram organizadas corridas de cavalos e de animais de tração, como bois, burros e mulas, que ficavam então liberados do trabalho e eram adornados com flores.

É importante ressaltar que muitas dessas tradições, embora assimiladas pelo cristianismo, perduram até os dias atuais, praticamente inalteradas, como, por exemplo, o Palio dell’Assunta, que acontece em Siena, em 16 de agosto. O termo palio (lat. pallium) nada mais é do que o manto de tecido fino, prêmio habitual aos vencedores das corridas hípicas que aconteciam na Roma Antiga. Além disso, era também costume que, naquela ocasião, os camponeses prestassem homenagem aos senhores, proprietários da terra, recebendo em troca uma gratificação em dinheiro [la mancia], tradição que se enraizou de tal modo que foi, no Renascimento, assimilada pela Igreja Católica. Trata-se, desse modo, de uma festa pagã que se torna católica em torno do século VII, período em que se começou a celebrar a Assunção de Maria. O dogma da Assunção, por sinal, foi reconhecido somente em 1950, estabelecendo que a Virgem Maria seja assunta, ou seja, acolhida com a alma e com o corpo.

Buon Ferragosto

Nos dias atuais, o Ferragosto, para a maioria dos italianos, nada mais é do que um feriado. Infelizmente, muitos desconhecem as verdadeiras origens desse dia tão especial e rico de tradições que remontam a tempos imemoriais. Normalmente, as famílias e os amigos se reúnem para um grande almoço onde não pode faltar a melancia! Muitos jovens e até mesmo adultos preferem festejar à beira-mar, organizando-se já no dia anterior para fazer uma fogueira na areia da praia, com muita música, dança, quitutes e bebidas. Quase sempre a festa acaba ao amanhecer do dia 15 de agosto.

Vale ressaltar que, hoje em dia, fazer fogueiras é proibido, embora as pessoas continuem a fazê-las, deixando as praias sujas, com os seus restos ainda acesos, causando não poucos acidentes. Por isso, se vocês um dia estiverem na Itália no dia de Ferragosto e forem à praia, muito cuidado com onde colocam os pés!

Se tiverem oportunidade, vejam o filme Il sorpasso, com Vittorio Gasman, Catherine Spaak e Jean-Louis Trintignant  (título no Brasil: Aquele que sabe viver), de 1962, obra-prima de Dino Risi, autor de um dos mais representativos afrescos cinematográficos que trata a Itália “del benessere” e do milagre econômico da década de sessenta.

Trama do filme Il sorpasso

A história se passa em Roma, no dia de Ferragosto de 1962, ocasião em que a cidade está completamente deserta. Bruno Cortona, de trinta e seis anos, um tipo vigoroso, mas cafajeste, amante da direção esportiva e de mulheres bonitas, vagueia em busca de um maço de cigarros e de um telefone público. Após o telefonema, acaba por se dirigir à casa de Roberto Marini, estudante de direito que decide passar o feriado em casa estudando para as provas que se darão em setembro. Bruno convida Roberto para passar o dia do Ferragosto juntos. Embora este hesite por um momento, acaba cedendo à insistência cerrada do amigo, e saem para um passeio de aventura ao longo da Via Aurélia, em alta velocidade, que os levará à Toscana, Castiglioncello. Os dois alcançarão metas ocasionais cada vez mais distantes. No meio da viagem em direção ao norte e ao mar, visitarão alguns parentes de Roberto, assim como a filha e a ex-mulher de Bruno.

O jovem Roberto, em vários momentos, estará a ponto de abandonar Bruno, mas, quer pelo acaso, quer por certa atração inconfessável, a insólita dupla de amigos permanecerá unida. Essa experiência para Roberto terá o teor de um percurso de iniciação à vida, pois ele, na verdade, afasta-se dos mitos e dos temores da adolescência e inicia a releitura e ressignificação das suas relações familiares, do amor e das relações sociais, até o trágico desfecho que se materializa durante a enésima ultrapassagem imprudente do amigo: o carro bate de frente com um caminhão, caindo em um precipício. Bruno consegue se jogar para fora do carro, salvando-se, enquanto Roberto perde a vida. À polícia rodoviária dirá não conhecer nem mesmo o nome do seu passageiro.

Sem dúvida é um filme cujo desfecho é para lá de trágico, mas que nos faz refletir muito sobre a nossa vida, pois continua a ser, apesar de mais de quarenta anos, uma das mais atuais produções cinematográficas italianas.

(Fonte: Wikipédia)

Arrivederci e buon Ferragosto!!!

Créditos das imagens: mentelocale.itlancianonews.net

Cláudia

Cláudia Lopes

Claudia Lopes é formada em letras pela UFRJ (português - italiano). Morou 8 anos na Itália, lecionou português na Università degli Studi di Bari; fala inglês fluentemente e estuda alemão. Mantém atualmente o site Affresco Italiano.

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